sábado, 8 de novembro de 2014

"Reclamar" é o meu nome do meio

Aportuguesar, ou como se diz em linguagem de tradutor: decalcar, a expressão inglesa "X is my middle name" soa sempre muito estranho, mas é, efectivamente, a melhor forma de transmitir a ideia de algo que fazemos recorrentemente e que, de certa forma, acaba por nos caracterizar. Os portugueses têm fama de reclamar muito, de contestar, dizer para o ar, manifestarem-se, mas pouco fazerem para mudar o estado das coisas.

Quantas vezes reclamamos de um serviço, seja ele qual for, à pessoa que está ao nosso lado, ao amigo que encontramos logo após o incidente ou a quem quer que cruze o nosso caminho enquanto ainda nos lembramos do que aconteceu? Hoje em dia, as redes sociais e a internet tornaram-se, também, um excelente veículo para reclamar, mas com poucos efeitos práticos porque a verdade é que nos coibimos de reclamar usando as vias oficiais.

As argumentos utilizados para não pedirmos o livro de reclamações, para não reclamarmos junto das entidades reguladoras da actividade em causa, para não reclamarmos junto dos provedores, entre outros organismos oficiais são quase sempre os mesmos: "Isso dá muito trabalho", "Vou perder imenso tempo com isso", "Para quê? Não vai dar em nada". Confesse, quantas vezes já pensou isto e deixou de reclamar pelos seus direitos? E ser tratado com educação é um direito que tem e um dever de quem trabalha com atendimento ao público. Ter acesso a uma consulta no Serviço Nacional de Saúde é um direito que lhe assiste e um dever do Ministério da Saúde.

Nos últimos tempos tenho feito cada vez mais reclamações utilizando as vias oficiais. Uma das últimas foi reclamar no centro de saúde porque uma consulta, pedida pelo meu médico de família com caracter de urgência, já foi adiada duas vezes, estando agora prevista a sua realização sete meses após o pedido do médico. Não existe organização na marcação e remarcação das consultas, as administrativas não fazem ideia das consultas que são urgentes e das que não são, e quando surge uma vaga porque alguém desiste, a mesma é atribuída ao primeiro que ligar, em vez de ser atribuída de acordo com uma listagem onde constem as pessoas com indicação de urgência.

Este tipo de situação é inadmissível. Estamos a brincar com a saúde das pessoas e continuamos as ser uma sociedade que aposta mais em processos de cura do que em processos de prevenção, quando está comprovado que a prevenção poupa dinheiro aos cofres do Estado e ao bolso das pessoas e contribui para uma melhoria do bem-estar geral, o que, por si só, traz outros benefícios em termos de saúde. É a chamada pescadinha de rabo na boca. Se temos cuidado e fazemos exames de rotina, conseguimos prevenir doenças ou descobri-las a tempo, o que nos permite evitá-las ou combatê-las utilizando menos recursos e menos tempo. Mas estas questões de senso comum parecem não chegar a quem manda.

A última reclamação foi apresentada na quinta-feira, por má educação de um funcionário numa cafetaria. Aprendi com a minha tia que quando um cliente reclama está a dar à empresa a possibilidade de corrigir o erro, enquanto que se o cliente se for embora irritado e começar a contar a toda a gente o que se passou, nunca mais volta a usar aquele serviço e influencia as pessoas à sua volta. Se o empregado gostou? Não, mas eu também não gostei da má educação dele e a empresa tem de saber os empregados que contrata.

Acho que vou criar uma nova actividade profissional. Está insatisfeito com um serviço ou situação? Gostava de reclamar mas não tem tempo nem paciência para isso? Não sabe qual a forma mais eficaz de o fazer nem como fundamentar a sua queixa? Eu faço-o por si, por uma pequena taxa. O primeiro-ministro não diz que temos de ser empreendedores e criar o nosso prórpio emprego? Isto sou eu a criar o meu próprio emprego.  

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