Os portugueses usam muito a expressão "acordar para a vida", seja quando se referem a um jovem que se desleixa na escola, a um recém-licenciado que se recusa a trabalhar por menos de 1000€, sem direito a carro e telemóvel da empresa, a um desempregado de longa duração que não pondera mudar de carreira, a alguém que não quer ver como o seu/sua parceiro/a é realmente ou a alguém que não amealha para "um dia de chuva".
Pode dizer-se que enquadro-me perfeitamente nesta última categoria. Vejo o dinheiro como um bem que serve para nos possibilitar determinadas coisas, é fruto do nosso trabalho e, por isso, devemos beneficiar daquilo que ele nos possibilita, em vez de guardá-lo, trancafiá-lo a sete chaves para uma qualquer eventualidade. Isto não quer dizer que não acredite em poupar, claro, mas essa nunca foi a minha prioridade.
De todas as vezes que poupei foi com uma finalidade específica. Poupei para ajudar a pagar a universidade, poupei para ir a Nova Iorque de férias, poupei para fazer obras na casa e mobilá-la... bem, para ser franca, aqui não se tratou tanto de poupar mas mais de arranjar o máximo de trabalho possível que me permitisse não ter de pedir um empréstimo ao banco, e aplicar todo o dinheiro ganho nesses custos mensais. E poupei para comprar o carro.
Acredito que trabalhamos para viver, não vivemos para trabalhar e cada vez mais me rejo por esta máxima.
Apesar de ter nascido no seio de uma família que tem como lema "guarda da risa para a chora", a verdade é que nunca me coibi de fazer o que queria ou de comprar o que queria, sem grandes extravagâncias, excepto as cometidas com viagens... não resisto a viajar! Mesmo quando os meus rendimentos reduziram, não deixei de ir onde queria ou fazer o que entendia, fosse jantar com os amigos, ir ao cinema ou ir de férias. E no meu aniversário e no Natal sempre me presenteei com coisas que queria mesmo, ou que na altura achava que queria mesmo.
Mas eis que chegou a altura de "acordar para a vida". Acho que, em muitos casos, as mudanças só se fazem quando apanhamos um susto. Como um homem que tem um enfarte aos 42 anos e deixa de fumar na mesma hora e passa a levar uma vida regrada. Pelo menos durante os primeiros tempos, anos, enquanto ainda se lembra do susto que apanhou. Como o jovem que "dá um beijinho" no carro da frente porque estava distraído com o telemóvel e jura que não voltará a enviar SMS enquanto conduz. Pelo menos enquanto se lembrar daquele toque. Como o traidor que é apanhado e promete que não voltará a fazê-lo, que foi só um deslize. Até deslizar novamente.
O que estes exemplos ilustram é que as boas intenções não bastam, é preciso muita força de vontade. Porque acordar para a vida é fácil, difícil é manter os olhos abertos ao fim de 48 horas de directa.
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